Aqueles carros velhos que deixam rastros de fumaça por onde passam podem estar com os dias contados, pelo menos na França. A Assembleia Nacional (parlamento francês) aprovou em primeira votação uma medida que prevê o pagamento de até 2.500 euros (cerca de R$ 16.800) às pessoas que toparem trocar suas furrecas por bicicletas, convencionais ou elétricas.
A proposta é do próprio governo de Emmanuel Macron. Vem a reboque de um projeto de lei sobre o clima que passa pelo parlamento e pretende reduzir em 40% as emissões de gases de efeito estufa até 2030 – tendo como referência os níveis de 1990. Se for aprovada, a França será o primeiro país a oferecer a seus habitantes um subsídio para abandonar o carro antigo e passar a pedalar.
Em termos ambientais, a medida é inovadora. Não se trata de incentivar carros menos poluentes, como os elétricos – cujas fontes de energia, como o grafite e o lítio, também são nocivas – ou como os veículos autônomos, que permitiriam reduzir o número de automóveis em circulação. Mas sim de um incentivo a um meio de transporte cada vez mais difundido no país: a bicicleta.
“Pela primeira vez se reconhece que a solução não é tornar os carros mais verdes, mas simplesmente reduzir sua quantidade”, disse Olivier Schneider, da Federação de Usuários da Bicicleta (FUB), em depoimento reproduzido pelo site Mobilize Brasil. A conquista, aliás, é atribuída à FUB, que tem atuado junto ao parlamento para garantir a inclusão da bicicleta na nova legislação climática.
PARIS GANHOU CENTENAS DE CICLOVIAS NOS ÚLTIMOS ANOS
Em geral, quando se fala em bicicletas na Europa o primeiro país que vem à cabeça é a Holanda, onde estas são tradicionalmente onipresentes, beneficiadas por um relevo predominantemente horizontal. Mas na França as redes de ciclovias têm se multiplicado e a venda de bicicletas explodiu, fenômeno registrado também em outros países do continente.
Na França, a popularização da opção pela bicicleta teria começado há alguns anos nas ruas de Estrasburgo, na Alsácia Lorena, região no nordeste do país que já pertenceu à Alemanha. Como o tempo, a presença de bikes aumentou também em outras cidades.
Nos últimos anos, Paris ganhou centenas de quilômetros de ciclovias. Só no ano passado, foram 170. O número de pessoas que se deslocam de bicicleta na cidade subiu 62% em dois anos, segundo dados oficiais. O Vélib, serviço municipal de aluguel de bicicletas, chegou a 400 mil usuários no ano passado.
A prefeitura da capital transformou em ciclovias cinquenta quilômetros de vias até então ocupadas por automóveis. Não escapou nem a Rue de Rivoli, movimentada via comercial que vai do bairro Marais ao Museu do Louvre. Anne Hidalgo, a prefeita socialista, disse que a inovação veio para ficar.
TOPOGRAFIA QUE FAVORECE USO DE BICICLETAS
A pandemia ajudou a impulsionar os deslocamentos sobre duas rodas, que teria aumentado 30% no país. E o Ministério dos Transportes identificou mais de quinhentos quilômetros de vias passíveis de serem transformadas definitivamente em ciclovias.
A associação Vélo & Territoires atestou um aumento de mais de 67% no uso de bicicletas em Paris em um ano. Esse percentual seria de 26% em Lille e a 24% em Lyon.
No caso de Paris, a topografia favorece as bicicletas, à exceção do bairro boêmio de Montmartre, com suas ladeiras características. Ali, as autoridades chegaram à conclusão de que aproximadamente 60% dos deslocamentos de veículos não vão além de quatro quilômetros.
Nessa toada, o governo francês criou um auxílio de 50 euros (cerca de R$ 320) para a reparação de bikes, que vigorou durante o ano passado. No período, foi contabilizado o conserto de 620 mil bicicletas no país.
A França sedia um dos maiores eventos esportivos ciclísticos internacionais, Tour de France, realizado todos anos desde 1903. A competição só foi interrompida durante as duas guerras mundiais. O percurso compreende 3.200 quilômetros que contornam todo o país e são percorridos em três semanas. Este ano, está programado para o período de 26 de junho a 18 de julho.