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A praga dos gafanhotos e a mudança dos ventos

A aproximação de uma nuvem de gafanhotos do Brasil tem dado o que falar. Houve quem brincasse que os insetos não chegariam ao Rio Grande do Sul porque fariam uma meia-trava nas plantações de maconha do Uruguai. Seria impossível seguirem viagem chapados. E a Fundação Cacique Cobra Coral (FCCC) afirmou ter modificado a direção dos ventos para afastar os gafanhotos do Brasil. A entidade, que mescla esoterismo e ciência, visa a intervir nos desequilíbrios provocados pelo homem na natureza e se diz capaz de controlar o clima.

Concentrados em Santa Fé, na Argentina, a 250 quilômetros da fronteira com o Rio Grande do Sul, os gafanhotos chegaram a 150 quilômetros do Brasil. A nuvem tinha uma extensão de dez quilômetros, e os gafanhotos podem viajar até cem quilômetros num dia.

“Estávamos na Região Sul, numa operação para elevar o nível dos reservatórios de água, e fomos chamados por uma empresa agropecuária para afastar os gafanhotos”, disse o porta-voz da FCCC, Osmar Santos. Sem explicar exatamente como teria sido possível modificar o clima, Santos afirmou que a Cobra Coral conseguiu acelerar a velocidade do vento e criar uma barreira de ar frio para impedir que os insetos chegassem ao Brasil.

O meteorologista Marcelo Zseluchi, do Centro Nacional de Monitoramento de Alertas de Desastres Naturais, foi mais preciso: disse que o ciclone bomba que atingiu o Sul do país teria ajudado a deter a praga.

 

VERANICO DURANTE A PANDEMIA

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, declarou inicialmente que as condições climáticas eram favoráveis à chegada da nuvem ao país, mas acabou ponderando:  “Estamos monitorando, mas tudo indica que ela vai ficar no Uruguai por enquanto.” Para Osmar Santos, foram as  mudanças empreendidas pela Cobra Coral que acabaram por contrariar as previsões iniciais. “O vento virou e mudou temporariamente a rota dos gafanhotos que viriam do Sul da Argentina para o Brasil”, disse ele.

O fato é que todo cuidado seria pouco: uma nuvem dessas contém cerca de 40 milhões de gafanhotos, capazes de devorar em um dia o equivalente ao alimento consumido por 2 mil vacas.

Com os nomes de seus clientes supostamente protegidos por sigilo de contrato, a Cobra Coral diz atender a governos e empresas de várias partes do mundo. No caso dos gafanhotos, teria servido a um cliente interessado em criar um veranico durante a pandemia do novo coronavírus. Trabalho semelhante teria sido executado pela fundação no Hemisfério Norte, onde houve um aumento das temperaturas antes do fim do inverno.

Diante da preocupação causada pela aproximação dos gafanhotos, o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag) reuniu mais de sessenta técnicos, pesquisadores e dirigentes em três teleconferências para discutir o problema e avaliar os passos a serem dados. Embora a colheita de arroz já tenha ocorrido nas plantações do Rio Grande do Sul, os insetos poderiam afetar culturas de inverno e pastagens.

Os especialistas do Sintag não pareciam muito convencidos da capacidade de atuação da Cobra Coral. Para eles, a solução para combater a praga seriam mesmo os velhos inseticidas.

Celina Cortes é jornalista e mantém o blog Sair da Inércia.

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