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Ciência busca dieta saudável para nós e o planeta

Um grupo de 37 nutricionistas, ecologistas e outros especialistas de 16 países – a Comissão Eat-Lancet para Alimentos, Planeta e Saúde – divulgou há aproximadamente dois anos um relatório indicando a necessidade de uma ampla mudança no sistema de alimentação mundial que levasse em conta a nutrição da humanidade e o meio ambiente. A recomendação foi de que as pessoas se tornassem “flexitarianas”, ou seja, comessem vegetais na maioria dos dias e, de vez em quando, um pouco de carne ou peixe.

Ainda que tenha levantado suspeitas sobre a viabilidade da proposta, o documento chamou a atenção para o conceito de dieta sustentável, levando cientistas, governos, empresas e organizações – incluindo a ONU – a buscar dietas saudáveis para as pessoas e o planeta. De lá para cá, dietas sustentáveis vêm sendo testadas em contextos locais, com a preocupação de não comprometer a nutrição das pessoas nem prejudicar seu sustento.

Uma experiência emblemática está sendo realizada em aldeias de pescadores no Quênia. Nessas comunidades, pesquisadores de saúde pública observaram que, apesar da abundância de peixes local, as crianças não os comiam. Alimentavam-se basicamente de farinha de milho e vegetais – e muitas tinham o crescimento comprometido por causa da pouca nutrição. A explicação dos moradores foi de que os peixes eram sua fonte de renda, e não destinados ao consumo local.

Os pesquisadores passaram, então, a fazer um experimento controlado. Para garantir a abundância de peixes, deram aos pescadores armadilhas de pesca com pequenas aberturas que permitem aos peixes jovens escapar e crescer antes de serem capturados. E os moradores foram incentivados a consumir espécies de peixe de rápido crescimento, de forma a não comprometer a atividade econômica local.

Diretor da Planetary Health Alliance, uma associação americana que estuda o impacto de mudanças ambientais sobre a saúde, Sam Myers afirmou à revista Nature: “Precisamos progredir para dietas que tenham muito menos pegadas de carbono, senão em algumas décadas começaremos a ver colapsos globais de biodiversidade, uso de terra e tudo isso.”

 

DIETA PARA SALVAR 11 MILHÕES DE PESSOAS POR ANO

A produção de alimentos gera uma quantidade tão grande de gases do efeito estufa que, mesmo que se os países eliminassem todas as outras fontes desses gases, ainda assim não seria possível limitar o aquecimento global a 1,5 grau até 2050, a meta estabelecida no Acordo de Paris. Estima-se que 30% a 50% dos gases do efeito estufa gerados pela produção de alimentos provenham da produção e consumo de carnes.

Se as pessoas tivessem uma dieta mais vegetariana, o mundo teria uma chance 50% maior de alcançar a meta, afirmam os cientistas. E se as dietas levassem a mudanças mais amplas na indústria alimentícia, essa chance aumentaria para 67%. Uma das dificuldades para mudar o sistema é a pressão da indústria de carnes.

A Comissão EAT-Lancet elaborou uma dieta saudável composta basicamente por alimentos integrais e levando em conta limites ambientais, como emissão de carbono, perda de biodiversidade e uso de água doce, nitrogênio e fósforo. Nessa dieta, o consumo semanal máximo de carne de uma pessoa com idade em torno de 30 anos seria de cem gramas, menos de um quarto do que um americano médio consome. A estimativa é de que uma dieta assim salvaria a vida de cerca de 11 milhões de pessoas por ano.

“É possível alimentar 10 bilhões de pessoas de maneira saudável sem destruir mais os ecossistemas”, afirmou Tim Lang, pesquisador de política alimentar da City University of London e coautor do relatório da EAT-Lancet. “Quer queiram ou não, os linha-dura do gado e da indústria de laticínios estão em posição desfavorável. A mudança agora é inevitável.”

 

SUSPEITAS SOBRE VIABILIDADE EM PAÍSES DE BAIXA RENDA

As estimativas da ONU não são animadoras. Mais de 2 bilhões de pessoas no mundo estão acima do peso ou obesas, a maioria delas no Ocidente. Ao mesmo tempo, 811 milhões de pessoas não estão recebendo calorias ou nutrientes suficientes, a maioria em países de renda média ou baixa. Como a população mundial continua a crescer e mais pessoas começam a comer o que os ocidentais comem, a produção de carne, laticínios e ovos teria que crescer 44% até 2050.

Esses dados não só geram preocupação com a saúde da humanidade, como configuram um problema ambiental, uma vez que a indústria de alimentos responde por um quarto das emissões de carbono no mundo, por 70% do uso de água doce e por 40% da cobertura das terras. É ainda uma atividade que depende de fertilizantes, responsáveis por grande parte da poluição de rios e mares.

Muitos cientistas afirmam que a dieta proposta pelos cientistas seria excelente em países ocidentais, onde as pessoas comem 2,6 vezes mais carne do que em países de baixa renda, onde os hábitos alimentares são insustentáveis. Outros questionam se a dieta seria suficientemente nutritiva nesses lugares de baixa renda.

Críticas à parte, a iniciativa dos cientistas pôs as preocupações ambientais no centro do debate sobre alimentação. Desde a publicação do relatório, cientistas de saúde pública vêm procurando maneiras de tornar a dieta realista para pessoas do mundo inteiro, levando em conta diferenças culturais e econômicas.

 

Com informações de artigo de Gayathri Vaidyanathan para a Nature.

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