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Quando se troca o duvidoso pelo “certo”

Sempre que se esbarravam no elevador, acenava com delicadeza. Era um deslumbre a beleza dela. A recíproca era verdadeira. Toda manhã, quando o via, gostava de ser gracejada por aquele “tipão”. Grande, forte, cara de homem, maduro, pinta de diplomata. Ai, mulher, se acalma!

Estava mal com o namorado. Nisso, virou presa fácil para um predador experiente. Entusiasmado, sem perder tempo Maneco gastou todas as fichas para se aproximar da diva. Sua estratégia foi criar um forte vínculo de forma rápida. Se pudesse escolher, ela preferiria tudo mais devagar. Estava gostando de ser cortejada; mais saboroso fica ver as coisas evoluindo sem pressa, com o passar do tempo.

Porém, seu namorado cometeu um deslize. Crise de ciúmes. Ao destratá-la em público, game over para ele.

Livre, leve e agora solta. Pronta para ser a mulher que quiser. E de quem quiser. Deixou-se ser seduzida por Maneco. Um jantar à luz de velas abriu aos pombinhos a porta das esperanças.

Inegável a forte atração que um exercia sobre o outro. Ambos inteligentíssimos, a primeira conversa mais longa a sós, como esperado, foi interessantíssima. Dois amantes da boa música, apreciadores de vinho, viciados em livros e viagens. Que sonho encontrar um príncipe! Ainda mais para alguém como ela, Sabrina, que adora trotar feliz e curiosa pelo mundo afora ao lado de uma companhia agradável.

Hora que voa, apesar da timidez ele a surpreendeu com um beijo único, ardente e temperamental. E se deixou levar pelos longos e incansáveis beijos dela, sua língua voraz, acompanhada de desejo e jogos de sedução.

Que química bacana! Foi difícil dormir na primeira noite. Homem firme, charmoso e de braços protetores mexe demais com a alma feminina. Ainda mais quando se está vulnerável. Terno e delicado, Maneco dosava bem seus lados masculino e feminino. E com porte másculo. Transmitia tanta confiança para ela, que num piscar de olhos acalmou seu trauma, suas memórias dolorosas. Fascinado por sua beleza, estava disposto a fazer qualquer coisa para não magoá-la. Ótimo, porque ela já não aguentava mais se lembrar das vezes em que confiou além da conta em quem no fim a decepcionou, machucando-a com atitudes ou palavras.

Após o começo animador, aos poucos a relação foi se complicando. Principalmente quando, ao contrário dela, ele não se resolveu. Ok, ela sabia que ele tinha outra, mas se ela pôde largar o seu, por que ele não podia fazer o mesmo?

Contido, organizado ao extremo, sua precisão e exatidão passaram a dar no saco. Seu jeito metódico a tirava do sério. Sem falar do pior: não poderem se assumir em público. Sempre que saíam juntos, tinham que tomar certos cuidados. Ele só se permitia relaxar em casa, na sua ou na dela, e ainda assim, fim de semana sim e fim de semana não. Afinal, a namorada oficial não fazia ideia do “Love” em que se meteu.

Ora, ora. Sabrina, mulher ávida por novidades e fuga da rotina, aceitando tamanho desconforto. Viver a solidão da pontualidade não lhe apetecia. Confiante, sempre prezou pela liberdade, por se aventurar, não ter hora, muito menos concorrência. Era bem o contrário de Maneco. Ele, sim, precisa de segurança, quer garantias. No trabalho ou na vida pessoal, não se arrisca. Nem pensar sacrificar a certeza, paz e tranquilidade que tinha com a outra. Tampouco sua autoconfiança. E se um dia Sabrina faz comigo o que fez com o ex?

Inegável que ele se sentia, de certa forma, inferior. Principalmente diante do brilho e da alegria dela. Talvez pela beleza estonteante de suas formas. Talvez pela diferença gritante de idade. Talvez por falta de coragem mesmo. Frouxo.

Com o passar dos dias, a atração foi perdendo o ímã. O apetite sexual dele não, mas o desejo dela murchou. Ele tinha presença, sabia se vestir, acompanhava as tendências, conhecia restaurantes, mas depois de dois meses tudo isso não se sustenta mais apenas com bom papo. É preciso atitude, o que ele não teve. Pronto, a casa caiu. Foi um vento que passou. Tão rápido como veio ela se foi.

Criei esse conto para mostrar que na vida há coxia e palco. Por trás do personagem – no caso, o príncipe encantado – pode haver um sapo medroso escondido. Até mesmo o Super-Homem não passa de Clark Kent na maior parte do dia.

Cuidado ao trocar o duvidoso pelo “certo”. Atrás de cada pessoa aparentemente perfeita, há uma bagunça que você não pode ver. Só conhecemos a verdade de cada um na intimidade. Um erro de avaliação pode ser fatal.

O Ministério do Amor Saudável adverte: deixar-se encantar por uma ilusão de ótica quase sempre rende inevitável frustração.

Marcos Eduardo Neves é jornalista, publisher da Approach Editora e escritor, autor de Nunca houve um homem como Heleno (Zahar).

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