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Indígenas paulistas cultivam alimentos de qualidade

Pode parecer incrível, mas o território da cidade de São Paulo guarda 14 aldeias de indígenas guaranis, oito das quais somam mais de oitenta roças onde são cultivadas 190 variedades de produtos agrícolas. A qualidade desses alimentos foi indicada por um estudo realizado por indígenas guaranis e pelo Centro de Trabalho Indigenista, e divulgado pela BBC Brasil.

“Para os guaranis, a comida não pode alimentar só o corpo, mas sim o espírito também”, afirmou Jera Guarani, moradora da aldeia Kalipety. “E a comida de branco não faz isso, ela só nos adoece mais rápido. Hoje tem um número notável de guaranis com diabetes e pressão alta, o que é relacionado com a alimentação que vem de fora.”

Os indígenas paulistanos priorizam o cultivo de milho, mandioca, feijão, batata-doce, abóbora e melancia. Para eles, trata-se de tembi’u ete’i, ou comida de verdade. Em suas terras não faltam também árvores frutíferas e plantas medicinais.

Embora considerável, o volume de alimentos produzidos pelos guaranis ali não é suficiente para sua subsistência. O antropólogo Lukas Keese, coordenador do estudo, considerou-o, porém, “muito significativo, pensando que há cerca de seis anos a produção era muito menor”.

Após décadas vivendo em duas aldeias, os guaranis da terra indígena Tenondé Porã – no extremo sul da capital paulista – iniciaram em 2013 um processo de retomada de seu território. Hoje são onze aldeias, oito delas em áreas da cidade e as outras nos arredores. Somam-se a esse território a terra indígena de Jaraguá, próxima ao pico de mesmo nome, no noroeste da cidade.

Keese explicou que o crescimento da agricultura em Tenondé Porã se deve à dispersão dos indígenas, numa dinâmica de demarcação de terras reconhecida em portaria do Ministério da Justiça de 2016. Os indígenas paulistanos ainda lutam, porém, pela conclusão do processo de demarcação. Falta a retirada de não indígenas, o estabelecimento dos limites do território e homologação pelo governo federal.

Os guaranis lutam também pela aprovação de um projeto de lei que prevê o fortalecimento do Cinturão Verde Guarani na cidade de São Paulo.

 

ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL É PRIORIDADE DOS GUARANIS

A pesquisa coordenada por Keese foi encomendada pela Prefeitura de São Paulo por meio da Secretaria de Desenvolvimento Urbano. A secretaria está à frente do projeto Ligue os Pontos, que visa a identificar os agricultores dessas terras e divulgar práticas de cultivo tradicionais.

Tenondé Porã tem cerca de 159 mil quilômetros quadrados e 1.500 habitantes – em 2012, eram cerca de mil. O estudo realizou o mapeamento da produção agrícola de seis de suas oito aldeias: Kalipety, Krukutu, Tape Mirĩ, Tekoa Porã, Tenondé Porã e Yrexakã. Constatou que ali a agricultura é uma ocupação de 35% dos 1.390 moradores. De cada dez agricultores, quatro são mulheres.

Nas seis aldeias estudadas, a safra de milho e mandioca chegou a 16 toneladas em 2019. Gerar renda, porém, não é uma prioridade dos guaranis. Os pesquisadores verificaram que os principais objetivos dos indígenas são garantir o consumo de alimentos saudáveis, fortalecer os saberes e práticas tradicionais, circular o conhecimento entre as gerações e conquistar maior autonomia.

“No conceito de vida guarani, temos que viver com o suficiente, nunca ser ganancioso e querer mais do que o necessário”, disse Jera. “Então, para nós, plantar, colher e vender já quebra essa regra.”

Para os pesquisadores, a possibilidade de os indígenas garantirem seu sustento por meio da produção agrícola em suas terras representa uma alternativa importante, “sobretudo em contextos políticos desfavoráveis de austeridade econômica e com ameaça de cortes de auxílios e direitos sociais”.

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