Depois de um esforço que se prolongou por mais de trinta anos, o DNA humano foi totalmente sequenciado, informaram cientistas do consórcio Telomere to Telomore, responsáveis pela tarefa. Novos métodos e avanços tecnológicos permitiram obter resultados finais que não haviam sido alcançados pelo Projeto Genoma Humano, iniciado em 1990.
Um dos cientistas à frente do consórcio, o biólogo americano Adam Phillippy explicou a dificuldade do trabalho realizado: “Imagine ter que montar um quebra-cabeça. Se você está trabalhando com peças menores, cada uma contém menos contexto para descobrir onde ela se encaixa, em especial partes sem nenhuma pista, como um céu azul.”
Os resultados do Projeto Genoma Humano foram apresentados em 2003, mas faltavam informações correspondentes a aproximadamente 8% do genoma humano. Esse desafio final foi vencido pelo consórcio americano, que reúne especialistas da Universidade da Califórnia, da Universidade de Washington e do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano.
Cientistas responsáveis pelo feito disseram que os resultados do trabalho ainda não foram anunciados oficialmente porque falta submetê-los a revisão e publicá-los em uma revista científica. Mas a pesquisa já está disponível na plataforma bioRxiv.
Parte dos pesquisadores envolvidos na finalização do sequenciamento genético participou do Projeto Genoma Humano, que reuniu especialistas de dezoito países e contou com financiamento do governo americano.
REVOLUÇÃO NA MEDICINA E DISPUTA ENTRE EMPRESAS
O genoma é o material genético de uma espécie, a informação hereditária codificada no DNA. Nada menos que 99,9% de sua composição são compartilhados por todas as pessoas, embora ele seja único para cada um. Na fita do DNA está registrado tudo o que o organismo precisa para funcionar e se desenvolver.
O sequenciamento representa a descrição de milhares de pares formados por quatro nucleotídeos do DNA: adenina (A), citosina (C), guanina (G) e timina (T). Elas se combinam de diferentes maneiras, determinando características que vão desde a cor dos olhos até uma doença hereditária.
A fita de DNA tem aproximadamente dois metros de comprimento e contém 3,2 milhões de pares de nucleotídeos. Ao todo, são 3.055 bilhões de “letras” que precisavam ser lidas. Daí a dificuldade de sequenciar o genoma, identificando os genes e suas funções. Foi preciso estudar cada ínfimo pedacinho da fita, localizando os genes e identificando a função de cada um deles.
O sequenciamento genético revolucionou a medicina. Em décadas passadas, os avanços científicos nessa área foram marcados por uma disputa entre a empresa Celera Genomics e o Projeto Genoma Humano, que acabou obtendo resultados mais rapidamente. Em 2000, o então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, declarou: “Hoje estamos aprendendo o idioma com o qual Deus criou a vida.”
Segundo cientistas, a finalização do processo de sequenciamento era dificultada pela falta de informações em áreas onde o DNA tende a se repetir e por limitações de tecnologia, que acabaram sendo superadas. Os avanços foram possíveis depois que o consórcio passou a utilizar a tecnologia das empresas Pacific Biosciences, americana, e Oxford Nanopore, britânica.
O próximo passo do desafio científico é recriar o DNA de ancestrais humanos para criar uma referência para o 0,1% que difere o genoma de cada um de nós. Batizado de Pangenoma Humano, o projeto pretende descrever 350 sequências de genoma humano relacionadas a pessoas de diferentes ancestralidades.