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Documentário mostra renovação por meio da meditação

Se você se interessa por meditação, o documentário Em busca do bem-estar (Netflix) pode superar suas expectativas. Em meio a sessões de meditação, o diretor argentino Alejandro De Grazia passeia com um pequeno grupo de pessoas por deslumbrantes paisagens em torno do Monte Fitz Roy, na Patagônia, recebendo lições para se livrar do estresse que o atormenta.

De Grazia, um documentarista angustiado, é convencido pela mulher a partir para uma viagem de autoconhecimento com o monge budista Matthieu Ricard, “o homem mais feliz do mundo”. Francês, 75 anos, Ricard é filho do renomado filósofo Jean-François Revel.

Integram o grupo um irmão de Ricard, o monge beneditino David, 92 anos, que passou anos em meditação; a neurocientista Tania Singer, que investigou o cérebro de Ricard em uma instituição alemã; e mais algumas pessoas.

O filme de 57 minutos começa mostrando num bucólico chalé ao pé do Fitz Roy, que tem 3.359 metros de altura e fica na fronteira entre Argentina e Chile. Suas neves eternas são visíveis em Bariloche. É ali que o grupo vai se hospedar.

Antes da viagem, o casal recebe o monge em seu apartamento, em Buenos Aires. Ricard revela ser fotógrafo e sempre ter tido a curiosidade de conhecer a Patagônia, “um lugar luminoso”.

 

‘É PRECISO CONHECER SEUS RECURSOS INTERNOS’

Dirigindo seu carro, De Grazia, 39 anos, revela-se ansioso, “uma mente como um macaco batendo palmas todo o tempo”. Com seu jeito humilde e harmonioso de se expressar, o monge o provoca: “Você pode domar o macaco”.

Para De Grazia se livrar de seu permanente estado de ansiedade, Ricard dá a primeira dica: “Essas coisas surgem dos conflitos entre nossos anseios e o que fazemos. Quando há uma lacuna entre os dois, há incômodo. É preciso conhecer seus recursos internos para lidar com os altos e baixos da vida para se sentir mais forte”, propõe. “Educar e treinar, isso é meditação.”

Na Ilha do Descanso, em Tigre, onde o monge parou para dar uma palestra, De Grazia ouve os conselhos do beneditino, outro profundo conhecedor da alma humana. Para a “inevitável” ansiedade, David sugere a consciência de se tratar de um sentimento passageiro, superável pela própria vida. “Sabemos como fazer porque nascemos de um canal estreito no parto, nossa primeira experiência de ansiedade. A vida faz com que o bebê confie instintivamente que conseguirá passar”, afirma.

Ali, a neurologista Tania Singer também dá sugestões para De Grazia se livrar de seu permanente estado de estresse, diante das exigências em torno de criar dois filhos e trabalhar num ritmo infernal. Ela é objetiva: “Na internet você pode receber muitos likes, e no dia seguinte muitos deslikes. Buscar satisfação fora não o fará feliz. Se não vier de dentro, dependerá do que a sociedade pensa de você, o que o deixará ameaçado.”

 

A MERA COMPAIXÃO NÃO BASTA

Já nutrido por muitas gotas de sabedoria, De Grazia chega aos arredores da Fitz Joy sob uma suave precipitação da neve. No chalé, de olhos fechados, o grupo cerca Ricard, o típico monge de cabeça raspada, quimono de tons terrosos e simplicidade absoluta. Ele começa lembrando como seu professor entremeava seus ensinamentos destacando a importância da motivação, “que proporciona qualidade a tudo o que vem depois”.

Numa atmosfera de útero materno, o monge prossegue como numa conversa entre amigos: “Todos os seres buscam a felicidade, mas estão confusos sobre o que pode torná-los felizes. Por causa desse desconhecimento, os seres vagam no samsara (o fluxo de renascimentos) por várias existências.”

Para Ricard, a mera compaixão não basta. Quando praticada para libertar todos os seres do sofrimento, porém, “começa a ficar interessante”. Ou seja, passear pela floresta, como eles mesmos fazem entre os encontros fechados, parar, voltar-se para dentro de si e cultivar suas qualidades já são um passo que cresce para um espectro mais amplo – “para progredirmos e tentarmos alcançar nossa liberdade interior e sabedoria, e nos tornarmos capazes de libertar os seres do sofrimento.”

Não se sabe por quanto tempo eles meditam e caminham pelas belas paisagens. Grazia sai dali renovado. Como adverte Ricard, uma coisa é certa: “Se for fácil demais, significa que não houve mudança. Exige treinamento, como para se tornar um atleta ou um bom músico. A coisa real vem com tempo, prática, esforço e alegria.”

Celina Côrtes é jornalista, escritora e mantém o blog Sair da Inércia.

 

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