Tornar a ficção realidade pode ser mais comum do que se imagina. Cada vez mais, grandes empresas recorrem ao design fiction para incentivar a inovação entre seus funcionários – e em seus produtos. Trata-se de uma técnica que usa a narrativa de ficção científica para criar outras realidades. Foi assim, provavelmente, que a empresa Klein Vision chegou a seu carro voador, que recentemente realizou a façanha de completar um voo de 35 minutos na Eslováquia. O smartphone, tão comum, é outro exemplo.
A ficção se torna “o grande ambiente de testes para a nossa realidade, uma vez que as experiências no design fiction têm como princípio criar um ambiente seguro, livre do que seja certo ou errado, com possibilidades a serem exploradas, traduzidas e compartilhadas em forma de linguagem, seja ela verbal ou imagética”, explicou a economista Lilia Porto em artigo para o site O Futuro das Coisas, do qual é fundadora e editora.
Além de estimular a criatividade de funcionários, o design fiction pode melhorar a comunicação entre eles. Chefe do núcleo de inovação e futurismo da agência de consultoria Up Lab, Lidia Zuin afirmou à IstoÉ Dinheiro: “Geralmente as empresas buscam a técnica para melhorar processos internos. O objetivo é auxiliar os colaboradores a entenderem uma situação hipotética no futuro, e assim promover maior espaço para criatividade, inovação. Isso ajuda no desenvolvimento de novos produtos.”
No Brasil, a Embraer é considerada uma das primeiras empresas a adotar a técnica: há dois anos, desafiou seus engenheiros a criar um roteiro de ficção imaginando o futuro da aviação, o que deu origem a três filmes de curta-metragem. Nos Estados Unidos, exercícios de design fiction levaram a Ford a idealizar uma sociedade em que carros não são comprados, mas sim compartilhados.
PENSAR NO FUTURO DESEJADO E EM COMO CHEGAR LÁ
O termo design fiction foi cunhado em 2005 pelo autor de ficção científica americano Bruce Sterling, mas estabeleceu-se a partir de um ensaio do artista e tecnólogo Julian Bleecker, também americano, em 2009.
Segundo Lilia Porto, a técnica permite trazer experiências de construção de cenários e especulação de futuros que se desdobram em ações, pensamentos, atitudes e personagens. “Tudo isso facilita a visualização de expectativas e oportunidades, bem como os desdobramentos das consequências”, disse ela.
Na experiência da técnica, nada precisa ser factível, mas é preciso transpor os cenários para a realidade, ou seja, pensar no futuro desejado e em como chegar lá. A prática costuma ser orientada por facilitadores e dividida em etapas. Um dos métodos descritos implica responder a perguntas como:
- Como o design deve impactar o mundo?
- Como podemos projetar um ecossistema mais saudável?
- O que podemos fazer para influenciar as culturas futuras?
- Como as tecnologias futuras podem impactar nossos produtos e serviços – e vice-versa?
- O que não queremos ver no futuro?
Lilia propôs quatro etapas:
- Escolha um setor e descreva seu papel na vida do consumidor.
- Escreva uma história sobre o futuro, mas livre das restrições de hoje.
- Suposições que tornariam esse futuro real.
- Prototipe o futuro de sua empresa.
Ela explicou: “Não existe apenas uma solução viável para se chegar a um futuro preferido – existem muitos caminhos que podem levar você até lá e, portanto, é importante simular diversas possibilidades. As etapas necessárias para passar da ideia para a realidade envolvem muita prototipagem, experimentação e abertura para mudar ao longo do caminho.”