O que todos nós queremos da vida? Uma resposta comum a esta pergunta costuma ser “felicidade”. Mas o que é preciso para alcançá-la? Será que sua relação afetiva, seu trabalho, sua casa, seu corpo e sua dieta podem fazer você feliz? Se não podem, alguma coisa estaria errada? Nat Rutherford, professor de teoria política da Universidade de Londres, faz essas perguntas para lançar a hipótese de que nossa obsessão com a felicidade pode ser uma receita para a infelicidade.
Em artigo para a BBC, Rutherford parte da ideia de que a felicidade é uma emoção ligada a saúde e bem-estar para supor que talvez estejamos procurando a felicidade de maneira errada. Ele cita o historiador Ritchie Robertson, que em recente livro, The Enlightenment: The Pursuit of Happiness, argumenta que o Iluminismo deveria ser entendido não como uma valorização da razão, mas sim como uma busca de felicidade por meio da razão.
“A força intelectual determinante da modernidade foi a felicidade e ainda hoje estamos nos debatendo com os limites desse projeto”, diz Rutherford. “É fácil supor que a felicidade sempre foi valorizada como o mais elevado bem, mas valores humanos e emoções não estão fixados permanentemente.” Ele argumenta: “A linguagem que usamos para descrever nossos valores e emoções e até os próprios sentimentos são instáveis.”
Rutherford afirma que as concepções modernas de felicidade são principalmente práticas, e não filosóficas, focando no que poderíamos chamar de técnicas de felicidade. O foco dessas concepções não estaria no que a felicidade é, mas sim em como alcançá-la. “Tendemos a ver a felicidade em termos medicalizados como o oposto da tristeza ou da depressão, indicando que a felicidade vem de reações químicas no cérebro”, explica.
A DOR QUE AS LIGAÇÕES AFETIVAS IMPLICAM
Rutherford cita a estudiosa de ética Martha Nussbaum, segundo a qual as sociedades consideram a felicidade um sentimento de contentamento ou prazer, com uma visão que valoriza muito os estados psicológicos. Os filósofos, afirma, tendem a ser céticos em relação a essa visão por considerarem que nossos sentimentos são passageiros e suas causas, incertas. Em vez disso, eles perguntam: O que é uma boa vida?
Uma resposta para isso seria: uma vida passada fazendo coisas de que você gosta e que lhe dão prazer. Mas maximizar o prazer não é a única opção, lembra o professor. Afinal, toda vida humana tem dor, observa. Dor de perda, dor de decepção, dor física e solidão, exemplifica. A dor é uma consequência inevitável de estar vivo.
O teórico lembra o filósofo grego Epicuro, para quem uma boa vida é aquela em que a dor é minimizada, o que coincide com a compreensão moderna de felicidade: estar em paz com si próprio. Mas discorda dele ao afirmar que uma boa vida aumenta a dor que sentimos. Isso porque as ligações afetivas estão relacionadas à felicidade, e amor também é causa de dor. “De forma menos dramática, todas as coisas boas da vida acarretam sofrimento, seja escrever um romance ou dar à luz um filho”, afirma.
Rutherford passeia por outros filósofos e conceitos para concluir que a felicidade não é um estado mental que possa ser conquistado permanentemente, mas sim uma prática que aprimoramos. “Reconhecer isso não assegura uma boa vida”, diz ele, “mas dissipa a esperança ilusória do eterno contentamento. Ao entender mal a felicidade, a concepção moderna aumenta a probabilidade de decepção.”
O professor recomenda mirar na visão de Aristóteles, que associa a felicidade à excelência das relações que cultivamos na vida. São elas que nos fazem florescer.