Em se tratando de consumo de alimentos, pesquisadores observaram que a crise do coronavírus é marcada por uma procura maior tanto por opções saudáveis, como produtos orgânicos, quanto por junk food, como hambúrgueres. Paradoxal? Nem tanto. A explicação desses especialistas é que as fortes emoções geradas pela pandemia afetaram o comportamento do consumidor de modo a levá-lo a buscar alimentos que lhe são mais familiares, sejam estes saudáveis ou não.
Em artigo para a Harvard News Review, três especialistas se baseiam em recentes análises e experimentos para afirmar que o acentuado aumento nas vendas tanto de Big Mac quanto de salada de couve é uma expressão de duas emoções cruciais que os consumidores sentem diante de doenças contagiosas: repulsa e medo. São essas emoções que nos levam a nos afastarmos de alguém que está tossindo ou espirrando, bem como a procurar o que conhecemos e evitar o que é estranho.
A análise é feita por Chelsea Galoni, PhD em administração pela Northwestern University (Illinois) e professora de marketing da Universidade de Iowa; Gregory S. Carpenter, professor de marketing da Northwestern University; e Hayagreeva Rao, professor de comportamento organizacional e administração de recursos humanos da Universidade de Stanford (Califórnia).
Para entender melhor a ligação entre doença, emoção e comportamento do consumidor, esses três especialistas fizeram duas grandes análises empíricas com base em dados dos Centros para Controle e Prevenção de Doenças (agência de saúde americana), do serviço Google Flu Trends e da empresa de pesquisas de mercado Nielsel. Fizeram também seus próprios experimentos.
Nesses experimentos, eles examinaram o modo como a presença de uma doença afetava os estados emocionais e as compras para o lar. Pediram aos participantes do estudo que lessem sobre uma doença contagiosa (gripe) ou sobre uma doença não contagiosa (insuficiência cardíaca). Depois, testaram as preferências dessas pessoas por produtos conhecidos e desconhecidos.
Os resultados confirmaram sua hipótese: pensar em uma doença contagiosa aumenta o medo e a repulsa. E em resposta a essas emoções, os participantes tentaram recuperar o controle buscando marcas familiares e nas quais confiavam. O mesmo não foi observado entre aqueles que leram sobre uma doença não contagiosa.
MOMENTO PEDE FOCO EM ESTRATÉGIAS DE MARKETING
A análise mostrou que quando a doença contagiosa estava mais presente entre os participantes, eles compraram mais produtos de uma maneira geral, mas compraram produtos familiares em índices desproporcionalmente mais elevados, fossem esses alimentos saudáveis ou petiscos industrializados.
Durante a pandemia, o crescimento das vendas da conhecida sopa Campbell’s tem sido bem maior que o de outras marcas. De forma semelhante, a procura pelo biscoito Oreo tradicional tem sido muito maior do que por um novo sabor da mesma marca. Em termos de estratégia de marketing, portanto, os resultados mostraram que esse não é o melhor momento para tentar ser criativo e lançar novos produtos. É hora de ter foco.
Para os pesquisadores, fabricantes e restaurantes podem estar enfrentando restrições em sua capacidade devido às exigências de distanciamento, mas essas limitações também podem ter um efeito positivo: forçá-los a focar nos produtos que os consumidores mais valorizam. As empresas mais bem-sucedidas nessa crise, segundo eles, são aquelas que concentraram seus recursos em produtos tradicionais, de forma a atender à maior procura por estes.
Em tempos normais, disseram os estudiosos, os consumidores baseiam suas decisões de compra em considerações práticas, como saúde, valor e preço. Mas em tempos de pandemia, quando sentem incerteza e medo, as preocupações práticas são sobrepujadas pelas reações emocionais. E no caso de uma doença contagiosa, o medo e a repulsa levam a um desejo natural de familiaridade e previsibilidade. Por isso, o Big Mac voltou a ser muito procurado, o Oreo voou das prateleiras e a venda de alimentos orgânicos também disparou.