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Quando a saúde é abalada pela relação com a autoridade

Em 2014, no início de seu mandato como prefeito de Nova York, Bill de Blasio expressou publicamente sua preocupação cada vez que seu filho jovem saía de casa. Ele instruía o rapaz a tomar medidas de precaução caso a polícia o abordasse na rua: faça tudo o que lhe pedirem para fazer, não se mova de repente, não pegue o telefone celular.

Um pai brasileiro poderia recomendar a mesma cautela. Semana passada, em Nova Friburgo, estado do Rio de Janeiro, uma jovem de 21 anos foi abordada por policiais militares quando seguia pela rua com um celular nas mãos. “De quem você roubou esse telefone?”, perguntou um deles. Ela mostrou registros de conversas com o pai no aparelho, nota fiscal e código de rastreio, mas só foi liberada quando algumas pessoas começaram a se aproximar.

Em comum, esses dois jovens de realidades tão distantes têm o fato de serem negros. No Brasil ou nos EUA, a relação entre policiais e negros pode ser tensa e violenta a ponto de abalar o estado mental não só das vítimas diretas de discriminação, mas da população negra em geral. Em recente artigo para o site Medical News Today, Hanna Al-Malssi, ativista do movimento Black Lives Matter, identifica o racismo sistêmico como causador de muitos problemas de saúde entre os negros.

Formada em história e ciência política pela Universidade da Califórnia, Hanna cita uma pesquisa publicada na American Journal of Public Health, segundo a qual jovens negros que tiveram contato com a polícia relataram mais sintomas de trauma e ansiedade. O estudo indica que a discriminação muda mecanismos de motivação no cérebro.

 

ATITUDES RECOMENDADAS A ALIADOS BRANCOS

Confrontos brutais com a polícia têm “um efeito devastador na saúde mental dos negros nos Estados Unidos”, afirma Hanna. Os assassinatos de negros nas mãos da polícia, diz ela, “ameaçam a saúde mental dos negros como resultado desse sofrimento coletivo, da falta de justiça e da menor valorização da vida percebida que essas instituições racistas continuam a perpetuar”.

Mas a ativista identifica também fortes manifestações de solidariedade aos negros nas redes sociais, o que fortalece o movimento: “Está se tornando cada vez mais evidente que os recentes eventos [de violência da polícia contra negros nos EUA] nos ensinaram a importância de ter aliados não negros para lidar com o racismo em todas as suas dimensões. Ela sugere cinco atitudes que brancos podem adotar para combater a discriminação racial:

  • Analise seus preconceitos e sua relação com negros. Alguma linguagem ou comportamento que deixa pessoas negras desconfortáveis? Esteja atento a comentários “inofensivos” sobre cabelo e outros estereótipos que traçam retratos negativos dos negros e representam pequenas agressões.
  • Instrua-se sobre as dimensões do racismo, a começar pela história da escravidão. É impossível compreender o atual movimento contra a discriminação racial sem perceber que essa é uma batalha antiga. Leia e assista a documentários sobre o tema.
  • Compartilhe informações educativas na mídia social. Embora possa não parecer significativa, uma postagem mostra pelo menos que você é um aliado do combate ao racismo e mantém o tema em discussão.
  • Manifeste-se ao testemunhar uma atitude racista na escola, no trabalho, na família ou entre amigos. Afirmações racistas são comuns em ambientes casuais, como jantares em família ou festas. O racismo casual não deve ser tolerado.
  • Defenda a causa. Seja participando de protestos, dando telefonemas ou enviando e-mails, é preciso combater injustiças. Isso exige envolvimento político. Denuncie atitudes violentas e injustas contra negros.

O caso da jovem constrangida por policiais em Nova Friburgo foi divulgado na mídia depois que seu pai, indignado, fez um relato nas redes sociais. Ele descreveu o que sentiu: “Na sequência me passou uma tristeza. Pode ser incrível, mas foi pelo comportamento da minha filha, que estava assustada, desnorteada e triste e aquela tristeza me pega. Mas também o sentimento de normalidade na fala dela me chamou atenção e me revoltou mais. Ali eu percebi que o oprimido estava sendo acostumado como se estivesse tudo certo. [Ela disse] ‘Pai, eles duvidaram do meu celular, mas pai, isso é normal’.”

Bruno Casotti é jornalista e tradutor.

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