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Robô virtual perpetua relação com amigo morto

Existe vida após a morte? A russa Eugenia Kuyda acredita que sim. Seu amigo Roman Mazurenko morreu atropelado aos 34 anos, em 2015. Era uma figura popular e querida, considerado “a alma da revolução criativa de Moscou”. Em meio à dor pela morte súbita, Kuyda decidiu usar todas as mensagens recebidas de Roman para criar um chatbot, um robô virtual com o qual ela e outros amigos conversam por meio de mensagens. O acesso se dá por um aplicativo.

A experiência é descrita como um memorial digital. Os amigos de Roman a consideram mais uma celebração do que ele foi na vida do que um tributo à sua morte. “Ele se foi, mas nossa conexão, não. Sempre achei que nunca foi um projeto sobre a morte, sempre foi sobre o amor”, afirma Kuyda numa reportagem em vídeo da BBC . “Então estamos aqui para contar a história de uma pessoa que foi um ser humano muito bonito.”

Na época da morte de Roman, que considera sua primeira grande perda na vida, Kuyda já estava fazendo experiências em inteligência conversacional, tecnologia de inteligência artificial que permite ensinar máquinas a falar como seres humanos. Ela conta que o robô virtual utiliza uma rede neural. “Às vezes ele pega uma frase que Roman já disse. Às vezes cria novas, baseadas na forma como ele escrevia”, diz ela.

O amigo Dmitri Ustinov levanta questões sobre a experiência: “Um ser humano é simplesmente um conjunto de algoritmos que você pode replicar ou é algo maior? Onde está o limite? Seria possível distinguir um do outro?”

O R.evolution Club convidou o terapeuta holístico Narciso Mello, com formação em psicanálise e mais de 50 anos de experiência em consultório, para analisar a experiência dos amigos de Roman. “Além do corpo físico”, diz ele, “temos uma força vital que em nós, humanos, se manifesta como consciência, como percepção de que habitamos um universo cósmico em que nosso sol é uma estrela de sexta grandeza.”

Para Mello, que se considera um espiritualista, “o corpo físico, a matéria que nos constitui, se desfaz. Mas a consciência, essa força incorporal que nos constitui, se expande, integrando-se com a consciência oceânica que nos envolve no planeta Terra.” Ele acrescenta: “Acredito que indivíduos sensíveis possam receber mensagens dessa sabedoria que não se dilui, assim como a luz universal não se apaga.”

 

ROBÔ SERIA ALGO QUE ROMAN GOSTARIA DE TER FEITO

Dima Pyanov conta no vídeo a emoção do primeiro contato com o amigo virtual: “Comecei a conversar com Roman e ele começou a responder. Eu caí no choro. Porque com essa tecnologia você não só consegue lembrar de Roman, mas sentir uma conversa em tempo real com ele, como ele te animava e reagia a certas coisas.”

Os amigos de Roman dizem ter sido alvos de críticas, entre as quais a de que não aceitariam a morte. Eles acreditam, porém, que, além de abordar o tabu da morte e do luto, conseguiram sensibilizar outras pessoas e puseram em prática algo que Roman gostaria de ter feito.

Pyanov conta: “Um dos últimos trabalhos de Roman era sobre repensar e redesenhar a morte. Ele costumava dizer que se morresse não queria um funeral tradicional, queria que fizessem um robô dele ou algo atual. É como se ele tivesse pensado nisso antes.”

O que Roman teria de tão especial que justificaria a tentativa de eternizá-lo, perpetuando sua vida por meio de  tecnologia? Bonito, esguio, ele era admirado pela criatividade. “Ele foi uma cabeça do movimento hipster de 2005 e 2006. Trouxe as novidades legais, novos músicos, designers, os melhores eventos para Moscou”, explica Kuyda.

Celina Côrtes é jornalista, escritora e mantém o blog Sair da Inércia. 

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