Então tá combinado, é quase nada
É tudo somente sexo e amizade
Não tem nenhum engano nem mistério
É tudo só brincadeira e verdade
Podemos ver o mundo juntos
Sermos dois e sermos muitos
Nos sabermos sós sem estarmos sós
Abrirmos a cabeça
Para que afinal floresça
O mais que humano em nós
Então tá tudo dito
E é tão bonito
E eu acredito num claro futuro
De música, ternura e aventura
Pro equilibrista em cima do muro
Mas e se o amor pra nós chegar
De nós, de algum lugar
Com todo o seu tenebroso esplendor?
Mas e se o amor já está
Se há muito tempo que chegou e só nos enganou?
Então não fale nada
Apague a estrada
Que seu caminhar já desenhou
Porque toda razão, toda palavra
Vale nada quando chega o amor.
Abro com essa letra de Caetano Veloso pois uma fiel leitora me pediu para desenvolver o seguinte tema: É possível transar várias vezes com a mesma pessoa sem se envolver?
Bom, o próprio Caetano certa vez assumiu: “Meu negócio agora é sexo e amizade. Acho esse negócio de amor uma coisa muito chata.” Após sobreviver a alguns casamentos, ouso concordar com ele. Sexo alivia a tensão. Amor a cria.
Brilhante, Woody Allen disse que “sexo sem amor é uma experiência vazia. Contudo, das experiências vazias é a melhor”. É por aí. Como teceu Arnaldo Jabor: “O amor sonha com a pureza. Sexo precisa do pecado. O amor é sonho dos solteiros. Sexo é sonho dos casados.” Raramente amor e desejo coincidem. Aliás, um de meus próximos livros trará a ardente história de um casal-exceção nesse quesito. A verdade é que, se existe casal que se ama e sequer copula, então uma relação sexual também pode não envolver amor. “É ginástica, não tem transcendência”, escreveu Martha Medeiros. Ok, mas até que ponto isso é negativo?
Assim como colega não é amigo, tesão não é amor. Contudo, há de concordar que é um entretenimento perigoso. Unir a ideia de amor ao primeiro encontro sexual é, de certa forma, ridículo para a maior parte das pessoas. Impera a ideia de que sexo é prazer e amor é compromisso. Se não for essa Coca-cola toda, ótimo. Suaram e passar bem, após o café. Mas, e se a química acontece?
Conheço um sedutor que ligou para uma ex-colega de trabalho chamando-a para sair. Bom restaurante, show bacana… se acabaram num motel. Para ele, valeu o preço a noitada. O problema é que ela queria mais. Sua baixa autoestima gerou um vazio interior. Sentiu-se usada, como realmente foi, devido à falta de uma expressão de amor. Detalhe é que ele a chamou para sair. Não para namorar. Virou canalha sem ser.
Reitero: sexo sem amor não necessariamente é uma experiência negativa. Pelo contrário. Em certas circunstâncias, é forma legítima de resolver as questões mais vitais. Separada da afetividade, uma boa transa não causa problemas emocionais a quem a procura apenas para saciar instintos primitivos. A falta de sexo, sim, principalmente nos homens altamente sexualizados, pode acarretar em confusão mental e levar à bancarrota um relacionamento sadio. Mulheres costumam separar melhor. Se não mais admiram o parceiro, vontade zero de dar para ele.
Particularmente, indico sexo casual em casos de notória dificuldade de progressão da relação. Ou seja, ambos não têm futuro. Ela é gostosíssima, mas mora longe demais; pega dois ônibus e um trem para chegar em casa. Ele é bom de cama pra cacete, mas não é do meu nível social; não o assumiria perante a família. Ela é um tesão de mulher, mas não é confiável; não tenho vocação pra corno. Ela é nórdica e está de passagem, vai ficar apenas duas semanas no país. Ele é famoso, tem a mulher que quiser, mas quero ver se entre quatro paredes é tudo isso mesmo.
Se for assim, os encontros tendem a dar certo. Muito mais do que, por exemplo, se a diferença for casado x solteiro – afinal, um ou os dois podem se apaixonar, e aí complica: causa “vibes” diferentes. Casado com casado, então, se desenvolverem conexões extra-genitálias, meio caminho para destruírem os matrimônios. E solteiro com solteiro? Bem, a médio prazo, pode se transformar em amor. Essa coisa chata do Caetano.
Por Marcos Eduardo Neves