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Homens em campanha por uma masculinidade sadia

Na contramão de recentes episódios de misoginia e feminicídio, homens brasileiros vêm se reunindo em movimentos de combate à violência contra a mulher e em prol de uma masculinidade sadia. Salta aos olhos o crescimento de grupos organizados, como Projeto Man, Homens Possíveis, Papo de Homem e Laço Branco, cada vez mais presentes nas redes sociais em luta contra o estereótipo de brutalidade associado ao sexo masculino.

A antropóloga Mirian Goldenberg é uma incansável estudiosa do tema. “Escrevi sobre isso no ano 2000, dizendo que estava em crise não a masculinidade, mas um modelo de masculinidade tóxica, violenta, agressiva, infiel, machista”, afirma ela ao R.evolution Club.

Mais de mil anos atrás, os vikings nórdicos já acreditavam que uma das quatro partes de sua alma, a fylgja, era feminina – contrariando, portanto, o modelo de machão que costuma caracterizá-los. “Todos os vikings carregavam dentro deles, literalmente, um espírito feminino”, afirmou ao El País o historiador britânico Neil Price, cujo livro Vikings, la Historia Definitiva de los Pueblos del Norte acaba de ser publicado na Espanha.

Mirian observa que há vinte anos “já se via homens buscando mudar, porque eles também são dominados e oprimidos por um modelo de masculinidade que não serve para todos.” Para ela, o modelo machista ainda está em vigor, mas já não corresponde ao que os homens são. “Há um modelo de homem agressor e dominador bem representado hoje na sociedade brasileira, porém não mais hegemônico”, afirma.

Muitos desses “dissidentes” começaram a exercer esse novo papel masculino na paternidade. Um exemplo é a comunidade Paizinho Vírgula!, fundada pelo escritor Thiago Queiroz. Entre vídeos e imagens bem-humoradas, ele lembra, no artigo “Libertando nossos filhos (e nós mesmos) dos papéis que aprisionam”, como seus pais lhe colaram a pecha de menino inteligente. “Precisamos parar e refletir para entender que o poder da nossa fala é imenso sobre aquilo que nossos filhos percebem de si mesmos”, alerta. “Parte da construção do que eles pensam sobre eles mesmos depende também do que nós dizemos a eles.”

A sensibilidade demonstrada por Queiroz parece impensável para os tipos truculentos que resistem, aprisionados num arquétipo que perde a validade, como atesta a comunidade Mikael/Masculino de Alma, em Florianópolis. Ali se dá voz a um grupo de homens que procuram, juntos, reencontrar a essência do masculino em suas almas.

Mirian Goldenberg é testemunha desse tipo de mudança: “Tenho observado homens que cuidam dos filhos e, quando se separam, querem assumir a paternidade plenamente. Às vezes não conseguem porque as próprias mulheres não confiam na capacidade deles de cuidar, alimentar, fazer dormir, dar banho.”

Integram essa tendência questões como “Quais são as masculinidades saudáveis, desejáveis e possíveis de nosso tempo?”. O projeto Homens Possíveis ajuda a responder a pergunta. Sediado no Centro Socioeducativo São José dos Pinhais, no Paraná, reúne adolescentes que cumprem medidas socioeducativas, adquirindo ferramentas para fugir do modelo tóxico de masculinidade.

O jovem canadense Marc Lepine nunca teve essa chance. Em 1989, ele invadiu uma sala de aula da Escola Politécnica de Montreal, ordenou que os rapazes se retirassem da sala e as moças ficassem. “Vocês são todas feministas”, gritou, enquanto atirava contra as jovens, matando 14 delas e ferindo dez, além de quatro homens, para depois se matar. Na carta que deixou, disse não suportar a ideia de ver mulheres estudando engenharia, uma carreira que considerava masculina.

O massacre motivou a campanha Laço Branco, presente em mais de cinquenta países e apontada pela ONU como uma das maiores iniciativas mundiais direcionadas a sensibilizar e mobilizar os homens no combate à violência contra a mulher e à desigualdade entre os sexos.

Para Mirian Goldenberg, “é libertador saber que os homens rejeitam e combatem um modelo que é opressor para ambos os sexos”.

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