Para entender como a perda da relação com o tempo e o espaço afeta o cérebro, quinze franceses passaram quarenta dias dentro de uma caverna sem relógio, sem celular, sem qualquer comunicação externa e sem ver a luz do sol. Como voluntários, eles participaram do projeto Deep Time, do qual saíram com impressões surpreendentes. Houve quem achasse que haviam se passado 23 dias.
Não faltaram relatos sobre a dificuldade de se organizar com as tarefas sem ter noção do tempo, mas surpreendeu também o fato de dois terços dos participantes terem afirmado que gostariam de ter prolongado a permanência na caverna. Eles disseram que isso teria lhes permitido dar continuidade a projetos que o grupo estava desenvolvendo ali.
A experiência foi vivida na caverna de Lombrives, no sul da França, por sete mulheres e oito homens com idades entre 27 e 50 anos. Para o Human Adaptation Institute, responsável pela iniciativa, o estudo ajudará a entender como as pessoas podem se adaptar a condições extremas, o que teria especial relevância nesses tempos de isolamento imposto pela pandemia.
Os voluntários dormiram em barracas e dispuseram de poucas facilidades modernas. Puxavam água de um poço de 45 metros de profundidade. Para ter eletricidade, rodavam um pedal de bicicleta. E para se organizarem sem ter noção do tempo, basearam-se em seus relógios biológicos e ciclos de sono. A temperatura ambiente era de dez graus e a umidade, de 100%.
‘FOI COMO APERTAR UM BOTÃO DE PAUSA NA VIDA’
Os quinze participantes saíram da caverna sorridentes e de óculos escuros, alguns desnorteados. Para Maria Lançon, de 33 anos, a experiência “foi como apertar um botão de pausa na vida”. Ela disse que podia fazer tudo sem pressa. Agora, planejava ficar mais uns dias sem o celular, a fim de evitar um retorno brutal à vida real. Já o professor de matemática e instrutor de iatismo Johan François contou que corria dez mil metros em círculo para se manter em forma.
O comportamento, as relações sociais e o padrão de sono dos participantes foram monitorados por sensores. Um dos sensores era um termômetro minúsculo que eles engoliram dentro de uma cápsula. O mecanismo transmitiu dados de temperatura para um computador antes de ser expelido naturalmente.
Oficialmente, a missão do projeto foi apresentada como “entender a adaptação da plasticidade cerebral ligada ao tempo, os impactos da falta de sincronização diante de uma nova situação de vida e a capacidade de um grupo humano de encontrar sincronização funcional quando imerso num universo totalmente novo e na ausência de uma de suas maiores referências: o tempo”.
Presidente do Human Adaptation Institute e líder da missão, Christian Clot afirmou: “Nosso futuro como humanos nesse planeta irá evoluir. Precisamos aprender a entender melhor como nossos cérebros são capazes de encontrar novas soluções qualquer que seja a situação.”