Se falar de lembranças pessoais no trabalho pode lhe parecer inapropriado, saiba que a nostalgia vem sendo considerada uma ferramenta importante para aprofundar relações profissionais, e até mesmo para promover a inclusão. Relembrar – e contar – uma situação vivida tempos atrás é uma maneira de despertar emoções que podem favorecer aproximações. Seja aquele show da banda favorita ou uma trapalhada com o antigo chefe.
Uma pesquisa liderada por Clay Routledge, professor de administração da North Dakota State University, nos Estados Unidos, mostrou que a nostalgia pode ser uma fonte de conforto e inspiração que ajuda as pessoas a atravessar momentos profissionais e as motiva a trabalhar melhor. Mais importante ainda, disse Routledge à BBC, é que a nostalgia ajuda a criar vínculos fortes dentro de uma organização, capazes de torná-la mais bem-sucedida.
“A nostalgia é uma experiência emocional muito social”, afirmou o professor. “As coisas que nos fazem sentir saudade do passado são experiências que pensamos ser pessoalmente significativas e que são compartilhadas com pessoas com as quais nos importamos.”
Para Routledge, a nostalgia é um sentimento que nos lembra de nossa natureza social e expõe o nosso lado social. Ao promover uma conexão com as pessoas, aprofunda relações ou constrói novas relações. E cria grupos mais coesos.
LEMBRANÇAS NEGATIVAS TAMBÉM PODEM FACILITAR APROXIMAÇÃO
Quando estamos com colegas da mesma faixa de idade, a nostalgia é capaz de resgatar experiências semelhantes vividas na mesma época por pessoas que não se conheciam, seja a lembrança de uma música antiga ou de um momento da vida de estudante. Trata-se de uma nostalgia coletiva, com a qual se pode criar empatia, bem como uma identidade de grupo.
“Isso tem uma espécie de efeito expansivo, tornando as pessoas mais abertas e tolerantes”, disse Routledge. “É como expor uma parte mais profunda de nossa humanidade por meio da qual nos conectamos.” Como exemplo hipotético, ele afirmou que a presença do cartaz de um filme atrás de alguém que participa de uma reunião no Zoom pode levar à descoberta de uma experiência em comum.
A nostalgia não se baseia apenas em lembranças positivas, assinalou o pesquisador. Um chefe ruim ou um projeto fracassado podem ser experiências capazes de aproximar pessoas, em meio a comentários do tipo “Ele era um cara terrível, mas eu cresci como profissional”.
De acordo com a pesquisa, a nostalgia pode ser também um motivador. A lembrança de pontos altos de uma carreira profissional ou de desafios vencidos pode ser inspiradora, principalmente quando envolve outras pessoas da equipe.
“É inspirador você sentir que superou algo”, observou Routledge. “Isso transmite uma mensagem de que houve momentos difíceis e de que há momentos difíceis pela frente. Mas essas lembranças são fontes de confiança e esperança. Elas nos fazem sentir vivos e energizados.”
AMBIENTES PARA FUTURAS MANIFESTAÇÕES DE NOSTALGIA
Outra constatação do estudo foi de que a nostalgia favorece a criatividade. Pessoas que se sentem socialmente conectadas – um efeito da nostalgia – teriam uma tendência maior a agir com confiança e assumir riscos no trabalho, o que incentivaria a criatividade.
Sim, a nostalgia também pode ter efeitos negativos, quando indica, por exemplo, que as pessoas estão presas ao passado numa empresa cujo foco está no futuro e em novos desafios. Além disso, no momento atual em que muita gente está trabalhando em casa, a conexão com colegas pode ser mais difícil, que dirá compartilhar lembranças. A socialização diminuiu.
Para Lakshmi Rengarajan, consultora profissional em Nova York, as empresas precisam criar condições que permitam a conexão entre os funcionários, ou seja, produzir ambientes que propiciem futuras manifestações de nostalgia. Segundo ela, a nostalgia é decorrência de boas relações, portanto é preciso promover ambientes que a favoreçam.
Routledge observou: “A nostalgia tem a ver tanto com futuro quanto com passado. Precisamos de inspiração e motivação. Recorremos a essas lembranças significativas e isso nos faz querer nos conectarmos e nos dá confiança para seguir adiante.”