O passo mais recente foi dado pelo Reino Unido, que antecipou de 2040 para 2030 a data em que dará início à proibição da venda de novos carros e caminhões movidos a gasolina e diesel. Outros países europeus já haviam anunciado a mesma meta, sendo que a Noruega tem um objetivo mais ousado: adotar a proibição a partir de 2025. Tais iniciativas reforçam uma tese que vem sendo levantada por especialistas do setor de energia: a indústria do petróleo está começando a viver uma decadência sem volta.
O objetivo primordial dessas medidas é substituir os carros movidos a combustíveis fósseis por veículos elétricos e, com isso, reduzir as emissões de carbono e os efeitos da mudança climática. Segundo uma análise de especialistas do setor energético divulgada pelo site Vice, a curva ascendente da indústria do petróleo chegou ao ápice e inicia uma inédita queda gradual que em trinta anos deverá representar uma redução de 30% em seu volume de produção. O mesmo estaria acontecendo com o gás e o carvão.
“Estamos no meio de uma transição de energia fundamental, que verá o grosso da indústria de combustíveis fósseis gradualmente eclipsado nas próximas décadas”, escreveu o jornalista britânico Nafeez Ahmed para o Vice. Sua afirmação se baseia num documento produzido por três especialistas de peso: Rodrigo Villamizar Alvargonzález, ex-assessor de estratégia do Departamento de Energia dos EUA; Randy Willoughby, professor de ciência política da Universidade de San Diego; e Vicente Lopez-Ibor Mayor, ex-presidente da Lightsource BP, a maior empresa de energia solar da Europa.
Intitulado “Energy and Power Futures”, o documento atesta a impossibilidade de, a partir de 2020, manter uma produção mundial de 35,7 bilhões de barris de petróleo por ano (100 milhões por dia). A pandemia estaria servindo para acelerar o declínio dessa indústria, já previsto por outras instituições internacionais, embora não com a mesma velocidade apontada por esse estudo.
Atualmente chefe de estratégia para as Américas na Kaiserwetter Energy Asset Management, empresa de investimentos em energia com escritórios em Hamburgo, Madri e Nova York, Villamizar e seus colegas apontam como motivos da decadência da indústria de petróleo uma combinação de iniciativas para conter a mudança climática que exigem um freio na produção de combustíveis fósseis; o avanço na produção de carros elétricos e outras formas de transporte; uma persistente baixa nos preços que estaria minando os lucros da indústria de petróleo; e uma redução dos investimentos em novas infraestruturas e tecnologias para essa indústria.
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL VERDE
Ao antecipar em dez anos a proibição da venda de novos veículos a gasolina e diesel no Reino Unido, o premier Boris Johnson seguiu os passos de outros países que já haviam estabelecido o prazo de 2030: Dinamarca, Eslovênia, Holanda, Irlanda, Israel, Islândia e Suécia. França, Cingapura e Sri Lança disseram que farão o mesmo a partir de 2040. Já a China manifestou igual intenção, mas não disse quando.
Ao estabelecer o novo prazo, Johnson anunciou uma “revolução industrial verde”, com investimentos em energia eólica, hidrogênio, energia nuclear, veículos elétricos, transportes públicos, ciclovias, pistas para pedestres e proteção de áreas naturais, entre outras iniciativas. Seus planos afetam também as moradias britânicas, que terão que substituir a calefação a gás por um sistema de baixo consumo de energia elétrica. Opositores consideraram as medidas do premier insuficientes.
Na Califórnia, o governador Gave Newsom divulgou em setembro um plano para instituir em 2035 a proibição da venda de novos veículos movidos a combustíveis fósseis. Castigado com frequência por incêndios florestais atribuídos à mudança climática, o estado é o que mais compra veículos no país. É também o que mais compra carros elétricos, tendo 34 empresas que os produzem ou pretendem produzi-los. E o mais populoso: 40 milhões de habitantes. Ali, os transportes representam metade das emissões de carbono. “Para chegarmos a uma economia sem carbono em 2045, não podemos fazer isso sem os transportes”, disse Newsom.
Todas essas metas se referem à proibição da venda de novos veículos movidos a combustíveis fósseis, ou seja, para além de 2030 ainda haverá muitos carros a gasolina e a diesel usados circulando nesses países. Além disso, indústrias importantes, como a de plástico e a petroquímica, continuarão dependendo de petróleo. Villamizar vaticina: “O petróleo não morrerá logo, mas já está descendo uma ladeira escorregadia.”
Bruno Casotti é jornalista e tradutor.