O príncipe Charles contratou dois engenheiros florestais paulistas para ajudá-lo a expandir o sistema agroflorestal no mundo. Donos da empresa de consultoria Pretaterra, com sede em Timburi, São Paulo, Paula Costa e Valter Ziantoni passaram a integrar a Aliança pela Bioeconomia Circular, recém-lançada pelo herdeiro do trono britânico com o objetivo de criar e incentivar projetos que tornem a agrofloresta economicamente viável em larga escala, com apoio do Instituto Europeu de Florestas.
Há 35 anos, Charles implantou um inovador sistema de produção orgânica na Duchy Home Farm, fazenda em Highgrove, no condado de Gloucester, que desde a Idade Média pertence à família real britânica. O sistema se tornou um modelo para as comunidades da região. A iniciativa serviu de inspiração para a nova iniciativa do príncipe, bem mais ambiciosa.
A ideia de Charles é criar uma rede que conecte e oriente investidores, empresas, organizações governamentais e não governamentais e comunidades locais. A empresa de Paula e Ziantoni se dedica à produção limpa de alimentos associada à regeneração florestal, provando que as árvores regeneram sistemas de produção ao mesmo tempo que trazem benefícios sociais.
A Aliança se encarregará de criar pontes entre projetos e financiadores, além de um fundo para sustentá-los. Seus integrantes têm em comum o interesse de construir conjuntamente um sistema de bioeconomia circular, focado na restauração da biodiversidade global. A economia circular envolve a eliminação de resíduos e poluição, bem como a regeneração de sistemas naturais. Já a bioeconomia se baseia no uso de matérias-primas naturais e renováveis, de origem não fóssil, para o desenvolvimento, produção e comercialização de bioprodutos e energia.
UM MILHÃO DE SEMENTES JÁ CULTIVADAS
Criada há quatro anos, a Pretaterra tem realizado projetos em lugares tão diversos quanto Marrocos, Índia e Costa Rica. O sistema agroflorestal que implantou na Fazenda da Toca, do empresário Pedro Paulo Diniz, em Itirapina, São Paulo, tornou-se exemplo de experiência em larga escala bem-sucedida. A empresa se baseia em dois princípios: modularidade e elasticidade. O planejamento por módulos – de hectares ou acres – inclui o estabelecimento de parâmetros, como custo, mão-de-obra, mudas e suplementos. Já o conceito de elasticidade funciona por meio da combinação de diferentes espécies por função, e não por tipo, em “nichos funcionais”.
A Pretaterra já implantou cerca de cem sistemas, transformando mais de 500 hectares no mundo, com mais de 1 milhão de sementes cultivadas e mais de 500 mil árvores plantadas. Esse portfólio chamou a atenção de Marc Palahí, diretor do Instituto Europeu de Florestas. Ao Valor Econômico, Palahí disse acreditar que sistemas agroflorestais podem e devem ter uma escala global. “Mas é preciso adaptar a abordagem às condições socioecológicas, culturais e de mercado dos diferentes países”, ressaltou.
A Aliança pretende estimular soluções circulares verdes em setores variados, como financeiro, farmacêutico, de construção, têxtil e transportes. E, além de sistemas agroflorestais, planeja incentivar fazendas orgânicas e sistemas silvo-pastoris. Seus membros incluem o Fórum Econômico Mundial, o World Resources Institute, o Fundo de Bioeconomia Circular Europeu, o Centro Internacional de Pesquisa Agroflorestal e a empresa farmacêutica britânica AstraZeneca.
Os dois engenheiros brasileiros têm currículos de peso. Paula é formada também em biologia e especializada em gerenciamento ambiental. Em 2016, foi premiada pela Sociedade Brasileira de Silvicultura. Ziantoni é especialista em gerenciamento e desenvolveu tese de mestrado na Zâmbia, trabalhando com conhecimento indígena local em projetos sustentáveis. Também realizou trabalhos voluntários na Ásia e na África. Juntos, eles vêm colecionando projetos de sucesso na Pretaterra.
Celina Côrtes é jornalista, escritora e mantém o blog Sair da Inércia.